Alguém se pergunta o que os sírios estão pensando dos
rebeldes que dizem estar “libertando a Síria” destruindo o país da mesma
maneira como os “rebeldes” fizeram na Líbia.
A Líbia, que nos tempos de Khadaffi era um país bem dirigido,
onde as receitas do petróleo eram compartilhadas com o povo líbio, ao invés de
ser monopolizado por uma classe monárquica como na Arábia Saudita, é hoje um
país sem governo e é assolado por disputas de diversas facções querendo o
poder.
Como ninguém sabia quem eram os “rebeldes” líbios, com elementos
da Al Qaeda entre eles, ninguém quem são os “rebeldes” sírios, nem se de fato
são rebeldes. Alguns “rebeldes” parecem ser grupos de bandidos que querem
aproveitar a oportunidade para roubar e estuprar, autodenominando-se “governos”
em vilas e cidades. Outros parecem ser da Al Qaeda.
O fato de os “rebeldes” estarem armados é uma indicação da
interferência externa. Houve denúncias de que Washington ordenou que seus
governos fantoches da Arábia Saudita e do Barein abastecem os “rebeldes” com
armas militares. Alguns suspeitam que a explosão que matou o Ministro da Defesa
sírio e chefe do governo não foi um homem-bomba suicida, mas por conta de um
míssil norte-americano remanescente das fracassadas tentativas de Washington de
assassinar Saddam Hussein.
Independente dos fatos, Washington considerou o ataque de
terrorismo como um sucesso, declarando que isso mostrou que os rebeldes
estariam ganhando “popularidade” e que levou o governo sírio a responder
através da abdicação.
O documento abaixo, escrito por uma agência de inteligência,
descreve previamente a intervenção terrorista do Ocidente na Síria, em caso de
um algo leitor ser ingênuo o suficiente a ponto de achar que “nosso governo
nunca faria isso”:
“Para facilitar a ação
das forças de libertação (sic!), [...] um
esforço especial deve ser feito para eliminar certos indivíduos-chave [...]
isso deverá ser feito na primeira etapa
da insurreição e intervenção, [...] Uma
vez que alguma decisão política tenha levado a distúrbios internos, a CIA,
junto o MI-6, estará preparada para montar sabotagens menores e golpes de
mestre (sic!) na Síria, trabalhando
através de contatos com indivíduos. [...] Os incidentes não devem ser concentrados em Damasco. [...]”
Continuando: “um
necessário grau de medo [...], de incidentes fronteiriços, dariam um pretexto
para a intervenção [...] a CIA e o MI-6 devem usar [...] suas capacidades tanto
nos campos psicológico e prático para aumentarem as tensões”. (Documento
conjunto da Inteligência Britânico-Americana, Londres e Washington, 1957)
Obama não disse porque seu governo está tão desesperado para
derrubar o governo sírio. O atual presidente, Bashar Al-Assad, era um
oftalmologista em Londres que retornou para a Síria para substituir seu pai –
que havia falecido – como presidente do país.
Washington omite seus verdadeiros motivos, mascarando-os
como uma retórica pseudo-humanitária, mas os motivos de Washington são bem
claros. Um dos motivos é para se livrar da base naval russa na Síria,
despojando a Rússia de sua única base naval no mediterrâneo.
O segundo motivo é eliminar a Síria como fonte de armas e
apoio ao Hezbollah, para que Israel possa ter sucesso em sua tentativa de
ocupar a parte sul do Líbano e saquear seus recursos hídricos. Os combatentes
do Hezbollah já derrotaram duas vezes as tentativas militares de Israel de
ocupar e invadir o Líbano do sul.
O terceiro motivo é destruir a unidade da Síria com conflitos
sectários, como Washington destruiu a Líbia e o Iraque, e deixar a Síria à
mercê de facções criminosas para desmembrar o país retirando assim outro
obstáculo para a hegemonia de Washington.
A Síria, Estado árabe secular, como foi o Iraque, é
governada por um partido político composto de Alawis, mais ou menos como os
muçulmanos xiitas. Os Alawis compõem cerca de 12% da população síria e são
vistos como hereges pelos muçulmanos sunitas, que compõem cerca de 74% da
população síria. Dessa maneira, a tão orquestrada “insurreição” apela para
muitos sunitas que vêem a oportunidade de tomarem o poder. (No Iraque, uma
minoria sunita governava para uma maioria xiita, na Síria é o oposto.)
As divisões entre os árabes os
tornam vulneráveis à interferência e à tirania do Ocidente. A divisão
sunita-xiita torna impossível para um país árabe se unir contra um invasor, ou
para que um país árabe ajude o outro. Em 1990, o governo sírio xiita se aliou
aos EUA contra o governo sunita do Iraque na Primeira Guerra do Iraque. Nem
Lawrence das Arábias, Nasser ou Kadhaffi tiveram sucesso em criarem uma
consciência árabe.
O pretexto de Washington para
derrubar outros governos por meio da violência é sempre encoberto de uma
verborragia moralista. Primeiramente, o alvo é demonizado, e depois a aberta
agressão de Washington é descrita como “levamos democracia e liberdade”, “derrubamos
um brutal ditador”, “protegemos os direitos das mulheres”.
Pelo jeito, qualquer massagem de
ego com palavras pomposas parece funcionar. Hillary Clinton esteve
especializada em advogar a derrubada do governo sírio. A mulher imbecil
direcionou ameaças contra a Rússia e a China por ousarem bloquear a tentativa
de Washington de usarem a resolução da ONU como um pretexto para invadir a
Síria.
Washington deturpa, dizendo que a
derrubada do governo sírio seria a derrubada de um governo que conduzia terror
contra seu próprio povo. Porém, Washington não condenou os seus próprios
ataques terroristas ou o do homem-bomba suicida, que matou funcionários de alto
nível do governo sírio.
As posições vacilantes de
Washington levaram o Ministro do Exterior da Rússia, Sergey Lavrov, a acusar
Washington de ter “intenções sinistras”. De fato, Washington tem.
O que surpreende a posição
sinistra de Washington quanto ao Iraque, Afeganistão, Líbia, Somalia, Yemen ou
Paquistão?
Sem dúvidas, depois que a Síria
for derrubada, Washington direcionará suas forças ao Irã. A própria Rússia já
está sendo cercada por bases militares norte-americanas, e o governo russo
possui uma oposição política desleal e traidora financiada com dinheiro norte-americano.
A China está confrontando o
rápido aumento das tropas norte-americanas navais, aéreas e terrestres no
Pacífico. Quanto tempo demorará para a China ter uma oposição ao governo desleal
e financiada por Washington? A hegemonia está em marcha, mas o que os sunitas
sírios vêem é uma oportunidade de derrubar os xiitas Alawites. Os sunitas
sírios aliar-se-ão a Washington, apesar do fato de Washington ter derrubado os
sunitas no Iraque.
Parece que poucos árabes se
importam em serem fantoches de um regime estrangeiro que os provêm com bilhões
de dólares. Washington sempre se refere ao presidente sírio Assad como um “ditador”
ou “brutal ditador”. Mas, sendo Assad um ditador ou não, ele não possui um
papel muito significativo. Em geral, ditadores não permitem que a oposição
cresça, menos ainda que ela se arme. Seria muito mais correto dizer que o
partido governante é autoritário, mas mesmo o partido que governa introduziu
elementos de democracia na nova constituição.
Como prova a experiência do
Iraque, os governos árabes precisam ser autoritários se as populações sunita e
xiita estiverem engajadas numa guerra civil.
Tanto Bush quanto Obama falam que
Washington trouxe “liberdade e democracia” ao Iraque.
Porém, a violência no Iraque está
tão ou mais intensa do que sob a ocupação americana. Eis aqui notícias dos
últimos dias:
23 de julho: “Uma onda ataques a
bomba e tiroteios, em Bagdá e no norte da capital, deixaram ao menos 107
pessoas mortas. Pelo menos 216 ficaram feridas.”
24 de julho: “Um segundo dia de
ataques intensificados deixou ao menos 145 iraquianos mortos, e pelo menos 379
foram feridos.”
25 de julho: “Ataques continuam
pelo Iraque: 17 mortos, 60 feridos”.
Foi isso que Washington fez pelo
Iraque. Longe de trazer a “liberdade e democracia”, Washington trouxe
sofrimento e morte intermináveis. E é precisamente isso que Washington quer
trazer para a Síria.