Por Derek Ford - Liberation School (Party for Socialism and Liberation)
Um dos protestos semanais contra a repressão
dos coreanos pelo governo japonês. Foto: Autor
No começo de 1956, a construção daquilo que as autoridades
japonesas e o público em geral pensavam ser uma fábrica de baterias, em uma
região agora conhecida como Oeste de Tóquio, e que na época era uma área de
cultivo, estava quase completa. No entanto, quando a construção da “fábrica” terminou,
em 10 de abril daquele ano um cartaz anunciava que ali era a nova casa da
Universidade da Coreia, que anteriormente era uma série de barracos anexadas a
Primeira Escola Secundária Coreana de Tóquio.
Este episódio é parte de uma muito mais longa e amplamente
desconhecida luta anticolonial dos coreanos no Japão, uma luta com implicações
e lições para todo o mundo. É uma luta que, assim como a luta dos coreanos de
uma maneira mais ampla, têm sido sistematicamente isolada. Como tal, é uma luta
que necessita de mais solidariedade internacional, particularmente de nossa
parte nos Estados Unidos. É uma luta que pode dar esperança e inspiração para
todas as pessoas que lutam contra o colonialismo e o imperialismo.
Além disso, é uma luta na qual a educação – uma das principais
tarefas daqueles interessados na transformação revolucionária – é o motor.
Hoje existem cerca de 800.000 coreanos vivendo no Japão, como
estrangeiros, ou “residentes permanentes especiais” com nacionalidade norte ou
sul-coreana. O Japão é a sua terra nata, mas por causa da divisão da Coreia
imposta pelos Estados Unidos, eles ainda não possuem sua pátria de volta.
No Japão eles sofrem discriminações políticas, econômicas e
legais, e especialmente desde 2002, estão sofrendo ataques físicos nas mãos das
autoridades japonesas e dos grupos de direita. A Chongryon, ou Associação Geral
de Coreanos Residentes no Japão, é a organização – ou melhor, movimento
– que luta pelos direitos dos coreanos no Japão, apoiando o seu modo de vida,
mantendo sua cultura e língua diante do colonialismo contínuo, e trabalhando
para a reunificação da pátria.
A origem dos coreanos no Japão: acumulação
primitiva, trapaças e escravidão
Existem três principais formas de como os coreanos chegaram ao
Japão na era moderna, o que em conjunto explicam como uma distinta – não
totalmente homogênea – comunidade coreana começou a residir na pátria colonial.
Elas também revelam as formas como o colonialismo japonês e o imperialismo
norte-americano criaram a diáspora coreana de uma maneira mais ampla.
Acumulação primitiva
A conquista da Coreia pelo Japão foi um longo processo que
encontrou uma feroz resistência. Começou em 1876, quando o Japão forçou que a
Coreia abrisse os seus portos e começou a se expandir para as Ilha Ganghwa, no
Mar Oeste da península. Através de uma série de procedimentos políticos e
legais – cada um deles apoiados pela força ou ameaça de força – o Japão anexou
a Coreia em 1905, e em 1910, formalmente submeteu a península ao seu domínio
colonial.
A colonização da Coreia pelos japoneses, como todas as
colonizações, foi brutal. O Japão violentamente reprimiu a sociedade, política
e cultura coreanas, colocando na ilegalidade todo tipo de organização política,
bem como a língua coreana. Os japoneses ainda forçaram os coreanos a adotarem
nomes japoneses.
Com um crescente poder industrial, o Japão necessitava de
colônias para conseguir matérias primas e mão de obra barata. Com a Europa
envolvida na Primeira Guerra Mundial, a manufatura japonesa substituiu a
manufatura europeia, o que levou a um boom nas exportações em 1910. Com a
expansão da economia, os trabalhadores lutavam por uma maior participação nos
lucros. Entre 1914 e 1919, a frequência e intensidade das greves cresceram e se
intensificaram rapidamente. O capital japonês precisava quebrar o poder do
trabalho organizado por meio da importação de mão de obra barata.
Ao mesmo tempo, o Japão estava em um processo de divisão das
terras comuns na Coreia, através de um projeto de levantamento de terras a
nível nacional. Eles acabaram redistribuindo a terra de camponeses para
latifundiários via preços inflacionados e impostos, reavaliando valores,
redesenhando limites e instituindo um sistema de registro. Este é um exemplo do
que os marxistas chamam de acumulação “primitiva” ou “primária”, processo pela
qual os capitalistas adquirem capital e produzem o proletariado, não através da
criatividade e frugalidade, mas por meio do roubo e da violência. O
levantamento de terras arruinou os pequenos camponeses, transferindo a terra
para os japoneses e para um número muito reduzido de latifundiários coreanos
colaboradores.
Na medida em que eram expulsos da terra, as companhias japonesas
trabalhavam conjuntamente om a polícia colonial para recrutar trabalhadores
para as fábricas japonesas. Prometiam aos trabalhadores o pagamento de altos
salários e liberdade de viagem, mas ao chegarem se deparavam com o oposto.
Muitos demandaram repatriação, mas as companhias raramente eram obrigadas a
fazer isso.
Com o final da Primeira Guerra Mundial, a economia japonesa entrou
em falência, começando com o crash da bolsa de valores, em março de 1920, a
pior crise econômica até o momento. Embora a força de trabalho coreana fosse
mais barata e mais contingente do que a japonês, eles foram os primeiros a
serem despedidos. Pelas próximas décadas, aqueles que tinham sorte o suficiente
para encontrar trabalho eram empregados como trabalhadores diários em projetos
de urbanização de larga escala, trabalhando em empregos mais perigosos pelos
salários mais baixos. Foram os coreanos que construíram muitas das barragens,
estradas e projetos habitacionais que existem no Japão até os dias de hoje.
Escravidão sexual
A extensiva rede de escravidão sexual japonesa representa outro
aspecto do movimento dos coreanos no Japão. Os militaristas japoneses enganaram
e sequestraram centenas de milhares de mulheres para que servissem como escrava
sexual dos soldados japoneses.
A prática não poderia ser mais brutal. As mulheres eram sistematicamente
estupradas e espancadas dezenas de vezes por dia. Quando elas ficavam doentes,
eram assassinadas ou deixadas para morrer sozinhas.
Enquanto as chamadas “mulheres de conforto” eram sequestradas
das colônias japonesas, de Taiwan até as Filipinas, a maioria delas vinham da
Coreia e Manchúria (uma grande porcentagem do povo na Manchúria durante essa
época era de coreanos).
A prática continuou no sul da Coreia depois que o império
japonês entrou em colapso, em 1945 e os Estados Unidos entrou no país. Em
outras palavras, quando os Estados Unidos tomaram o controle da Coreia do
Japão, eles também tomaram o controle dessas estações de estupro. Durante a
guerra da Coreia, essas estações serviam as tropas da República da Coreia, bem
como a das Nações Unidas.
A luta por justiça para essas mulheres continua e é parte
importante do amplo movimento de paz e justiça dos coreanos. Da mesma forma, a
repressão contra essa luta continua. O governo japonês recentemente promoveu
uma campanha para que cidades ao redor do mundo removam as estátuas em memória
as Mulheres de Conforto, de São Francisco à Manila. Eles até mesmo tentaram influenciar
que editoras de livros escolares norte-americanos omitam qualquer menção a
escravidão sexual japonesa. Embora todas, com exceção de algumas dúzias, tenham
morrido, o seu espírito ainda impulsiona a luta dos coreanos adiante.
A agitação política reverberou ao longo das décadas, na medida
que a depressão econômica se juntava com as demandas anticoloniais. Em primeiro
de março de 1919, começa um massivo movimento de protesto pela independência
dos coreanos.
Dois anotes antes, a Revolução Bolchevique deu uma nova forma a
luta dos coreanos por libertação. Comunistas e anarquistas começaram a se
reunir nas fronteiras da Rússia, China e Coreia. No começo da década de 20, uma
série de sindicatos radicais coreanos foram estabelecidos no Japão. Em 1925, 12
desses sindicatos se fundiram no Roso (Federação Coreana do Trabalho no Japão),
que no ano seguinte teria mais de 9.000 membros, e três anos depois mais de
30.000. Em resposta, os coreanos foram severamente reprimidos no Japão, com os
seus movimentos policiados e altamente regulados.
Trabalho forçado
Apesar da ameaça que a população coreana organizada representava
o Japão entre as duas guerras, a Guerra do Pacífico (Segunda Guerra Mundial)
trouxe mais uma vez a necessidade de mão de obra adicional. Com as ambições do
Japão imperial mobilizando largos segmentos da população japonesa adulta, o
Japão trouxe mais de 1 milhão de trabalhadores coreanos para suprir a escassez
de mão de obra.
Eles utilizaram a Lei de Mobilização Nacional – aprovada em 1938
para colocar o império em marcha para a Guerra – para recrutar a força
trabalhadores coreanos e trazê-los para o Japão, onde serviriam como
trabalhadores escravos. Em alguns casos eles eram sequestrados da Coreia,
enquanto outros eram enganados que ao chegarem no Japão teriam um futuro
brilhante. Uma vez lá, eles não tinham controle sobre suas condições de
trabalho e vida.
Um dos tuneis cavados por trabalhadores
escravos coreanos em 1944-45. Foto: Autor
Trabalhando em fábricas de munições, construção e mineração,
eles também construíram tuneis subterrâneos secretos que serviam como base para
armazenar aviões e bunkers para a força aérea. Coreanos, frequentemente
crianças, construíram centenas de milhares de redes de tuneis com suas mãos e
picaretas. Logo após a derrota do Japão em 1945, o governo ordenou que todos os
documentos relacionados a esse projeto fossem queimados, então ninguém poderia
saber quantos morreram na construção. Durante as últimas décadas, ativistas
japoneses e coreanos vêm estudando essa questão. Acadêmicos descobriram que os
tuneis eram usados para armazenar munições durante a guerra dos Estados Unidos
contra a Coreia.
Muitos desses trabalhadores escravos morreram durante os
bombardeios atômicos de Hiroshima e Nagasaki. Eles nunca foram reconhecidos pela
história japonesa.
Um tempolo budista da Chongryon, junto com grupos civis no Japão
e de ambas Coreias, encontraram alguns restos mortais e atualmente lutam para
trazê-los para o Parque da Paz da Zona Desmilitarizada da Coreia.
O colapso do império japonês na Coreia: derrota
e libertação parcial
A rendição incondicional do Japão, em 15 de
agosto de 1945, não se iguala diretamente a libertação da Coreia
Desde 1931, guerrilhas nacionalistas e comunistas lutaram nas
montanhas da Manchúria contra os japoneses. Kim Il Sung emergiu como um líder
particularmente eficaz durante este período, tanto que os japoneses tinham
destacamentos especiais encarregados de assassiná-lo. Enquanto as guerrilhas se
espalhavam por toda a Manchúria e na parte norte da Coreia, os Estados Unidos se
mobilizaram para que elas não tomassem toda a península.
Na noite anterior a rendição japonesa, dois oficiais
subordinados dos Estados Unidos, Dean Rusk e Charles Bonesteel, pegaram um mapa
geográfico da Coreia. Nenhum dos dois havia estado ou falavam uma palavra em
coreano. Eles dividiram o país ao longo do paralelo 38, que estava aproximadamente
no meio, mas permitia que os Estados Unidos mantivessem o controle da capital,
Seul. Os Estados Unidos e a União Soviética tinham concordado em
temporariamente o país ao meio, com o exército de cada um ocupando um
respectivo território. A divisão duraria cinco anos, momento em que ambas as
tropas, soviéticas e norte-americanas, partiriam.
Com a derrota japonesa, comitês populares surgiram
espontaneamente por toda a península coreana. No Norte, estes formariam a base
de um governo provisório, e a União Soviética apoiaria todas as decisões feitas
pelo poder local. No Sul, ao contrário, os Estados Unidos estabeleceram uma ditadura
militar, apoiando Syngman Rhee, que havia estudado em Princeton e Harvard e
socializado com o establishment político norte-americano por décadas. A
ditadura suprimiu violentamente os comitês populares e massacrou a esquerda.
As cinzas dos trabalhadores escravos coreanos
que aguardam retornar para a Coreia. Foto: autor
Era evidente para qualquer observador que sem a ocupação militar
norte-americana, os nacionalistas e comunistas venceriam na Coreia. Como tal,
os Estados Unidos moveram para tornar a ocupação permanente, realizando
eleições no Sul em 1948. A maior parte da população boicotou a eleição e a
União Soviética e o governo provisório no Norte denunciaram o movimento.
Em resposta a esta construção artificial do Estado Sul-coreano,
a República da Coreia, a República Popular Democrática da Coreia foi fundada no
Norte em 9 de setembro de 1948.
Isso serviu para aumentar as incertezas e aguçar a luta. A
Coreia havia sido um país unido por séculos e ninguém aceitava a divisão em
dois estados como legítimo ou permanente. Havia um consenso geral de que se os
Estados Unidos tivessem seguido adiante com o seu acordo inicial com a União
Soviética, permitindo a realização de eleições em todo o país, Kim Il Sung
haveria vencido sem esforços. Os Estados Unidos certamente sabiam disto, razão
pela qual criaram o Estado sul-coreano.
Coreanos no Japão em uma década de incerteza
Com a derrota do Japão em 15 de agosto, 1945, havia entre 2 e
2,5 milhões de coreanos no Japão. Uma pesquisa do governo descobriu que 80% dos
coreanos no Japão desejavam retornar para casa, mas eles não podiam por três
razões. A primeira, o Quartel-General – o supervisor dos Estados Unidos
comandado por Dougllas MacArthur – não os deixaria levar nenhuma propriedade
com eles. Segundo, aqueles que fossem não seriam permitidos retornar e visitar
os familiares que ficaram. Finalmente, porque os coreanos sofreram por décadas
baixo a superexploração, a maioria não tinha nenhuma condição para se
repatriar.
Os coreanos no Japão estavam em um estado de limbo. Eles,
também, recusaram a aceitar que esta situação como legítima ou permanente. Mais
ainda, por volta de 90% vinham da parte Sul da península. Alguns voltaram para
casa para encontrar ocupação norte-americana, violência, caos, doenças e
extrema insegurança econômica. De fato, comunistas da parte mais meridional do
país – que estavam mais geograficamente próximos do Japão do que da RPDC –
fugiram para o Japão para escapar da repressão militar da ditadura de Rhee na
Coreia do Sul.
Por exemplo, 40.000 coreanos foram para o Japão depois que as
autoridades sul-coreanas, apoiadas pela administração militar norte-americana,
esmagaram o levante nacionalista e comunista na Ilha Jeju, em 1948-1949. A
certa altura, cerca de 4/5 da população da ilha vivia em Osaka.
Em 15 de outubro de 1945, nacionalistas, comunistas e coreanos
progressistas em geral formaram a Joryon, ou Federação dos Coreanos no Japão. A
Joryon se inclinava cada vez mais para o governo provincial no Norte, e
particularmente para a liderança de Kim Il-Sung, que possuía um alto prestígio
não só entre coreanos, mas também entre radicais e intelectuais japoneses e
todos os povos progressistas do mundo. A Joryon tinha assim uma aliança com o
Partido Comunista Japonês (e de fato havia uma longa e complexa história de
cooperação entre coreanos e revolucionários japoneses).
As escolas foram estabelecidas reivindicando a cultura coreana
que o Japão havia se esforçado tanto para suprimir. Isto também foi visto como
uma preparação para um eventual retorno para uma Coreia unida. Os japoneses
iriam depois (e temporariamente) apoiar os esforços dos coreanos por
repatriação para a RPDC, com o desejo de se livrarem da população que eles viam
como “rebelde” e “etnicamente inferior.” Antes da repatriação terminar em 1984,
mais de 90.000 coreanos haviam retornado para a RPDC. Muitos enviaram membros
da família com a esperança de que em breve a Coreia seria reunificada. Como
resultado, muitos coreanos no Japão atual possuem parentes na RPDC.
As escolas da Joryon representaram uma ameaça a ordem pós-guerra
e muitas delas foram fechadas. Então, coincidindo com a formação da RPDC e da
ROC, em 1948-49, o Quartel General invadiu e desmantelou violentamente a Joryon
e suas escolas, matando vários estudantes neste processo.
A Mindan (União de Coreanos Residentes no Japão), uma
organização pró-EUA e pró-japonesa rival, foi formada em 1946. Mindan era – e
ainda é – leal à República da Coreia, e os membros da Mindan são cidadãos
sul-coreanos. Eles não sofreram nenhuma repressão estatal, embora seus membros
ainda sofram racismo e discriminação anti-coreana.
Chongryon: Lutando contra a discriminação, pela paz e pela
reunificação
A Guerra dos Estados Unidos contra a Coreia, de junho de 1950
até julho de 1953, enraizou profundamente a divisão da península. Os coreanos
no Japão tinham que, em certo sentido, escolher entre a RPDC e a ROC. A
esmagadora maioria da população (cerca de 90%) apoiou a RPDC, vendo-a – em vez
dos fantoches dos Estados Unidos da ROC – como a representante da nação
coreana. Afinal, um governo popular dominava o Norte, apoiado pelo prestígio
internacional de Kim Il Sung e outros grandes guerrilheiros.
Sob o domínio colonial japonês, os coreanos eram cidadãos
japoneses. Mas em 1952 sua nacionalidade foi revogada. Perderam o direito ao
voto, não podiam viajar e estavam excluídos de uma série de oportunidades de
emprego. Eles estavam isolados. Além disso, muitos agora eram da segunda geração,
o que quer dizer que eles tinham crescido e vivido a vida toda no Japão.
Não havia escolas japonesas onde qualquer coisa coreana fosse
ensinada, ou mesmo onde os estudantes pudessem falar coreano. O racismo anti-coreano
era galopante em todas as escolas e sociedade japonesas.
Uma nova organização para progressistas, comunistas e
nacionalistas estava sendo preparada desde a dissolução violenta da Joryon, mas
somente no início de 1955 que uma nova organização surgiu: a Chongryon. Ela foi
fundada oficialmente em 25 de maio daquele ano. A organização foi fundada
especificamente para organizar ao redor da RPDC os coreanos no Japão, o que
significava trabalhar para a reunificação pacífica e criação de suas próprias
instituições culturais e institucionais no Japão.
A Chongryon olha para dentro de sua própria comunidade e também
para sua terra natal. Ela tomou a posição de não interferência na política japonesa,
aderindo as leis japonesas (assim cortando laços com o Partido Comunista
Japonês).
Com um financiamento generoso vindo da RPDC – ainda mais
significante dado ao fato de que a RPDC estava naquela época reconstruindo sua
infraestrutura depois da devastação da guerra – a Chongryon iniciou a
reconstrução de centenas de escolas, bem como de associações, equipes
esportivas, instituições culturais e profissionais. Eles chegaram até
estabelecer o seu próprio banco e uma companhia de seguros.
Foi neste cenário que os coreanos no Japão construíram a
“fábrica de baterias”, ou melhor, a Universidade da Coreia – a única
instituição de educação superior da Chongryon.
Educação Coreana no Japão atual e a luta
contra a discriminação
As escolas da Chongryon são relativamente autônomas do controle
japonês porque elas tecnicamente não são “escolas”. Em vez disso, sob a Lei de
Educação Escolar do Japão, elas são consideras como “escolas diversas”. Isto
significa que elas têm o seu próprio currículo e são auto-financiadas,
principalmente através de doações e matrículas.
As escolas são amplamente populares dentro da comunidade da
Chongryon, mas mesmo os coreanos no Japão que não são afiliados na Chongryon
enviam os seus filhos para as escolas, para que eles aprendam sua própria
língua, cultura e heranças, estudando em escolas livres do racismo
anti-coreano. Isto é particularmente verdade para os casos do ensino
fundamental e médio.
Atualmente a Chongryon conta com 10.000 estudantes nas escolas
primárias e secundárias. Sua composição é variada: por volta de 45% possuem
passaporte da RPDC, 55% passaporte da ROC, e o restante possui passaporte
japonês. No entanto, isto não significa que 45% apoia a RPDC, 55% apoia a ROC,
e 10% apoia o Japão. Ser um cidadão estrangeiro da RPDC acarreta uma série de
fardos adicionais. Eles não podem viajar livremente for a do país, e não podem
visitar a Coreia do Sul. Muitos obtêm o passaporte da ROC, mas ainda apoiam a
RPDC. Isto permite que eles possam viajar tanto para o Norte, quanto para a
Coreia do Sul, bem como para outros países, como os Estados Unidos e a
Inglaterra. Ter um passaporte da ROC ou um passaporte japonês não é uma
barreira a adesão formal ou informal à Chongryon.
A autonômia da Chongryon vem com um custo significante. Os
empregadores discriminam aqueles que possuem diplomas das escolas da Chongryon.
Além disso, as universidades japonesas não aceitam diplomas da Chongryon,
portanto os estudantes devem pagar e passar em um exame de admissão adicional.
Em 2010, o governo japonês introduziu um programa de dispensa de
matrícula para estrangeiros nacionais frequentarem as escolas no Japão. Estudantes
em escolas chinesas e americanas, por exemplo, possuem sua educação
completamente ou altamente subsidiadas pelo governo. As únicas escolas
excluídas são as escolas da Chongryon. Isto durou de jure até 2013,
quando o governo Abe tornou oficial o programa através da revisão de uma
portaria do ministério. A razão oficial foi a de que o governo não pode
verificar o currículo da Chongryon. Contudo, o governo não pediu para verificar
o currículo de nenhuma outra escola estrangeira.
Governos locais, no entanto, algumas vezes fornecem subsídios
para as escolas da Chongryon. A maioria, no entanto, segue as orientações do
governo nacional e cortaram os subsídios.
As famílias também não são elegíveis para existir isenção de
impostos pelas doações feitas às escolas da Chongyron, diferente do que ocorre
para doações para todas as outras escolas estrangeiras.
Tal estrangulamento financeiro aperta o nó contra toda a
Chongryon e, por extensão, contra toda a comunidade coreana no Japão. Com a
comunidade da Chongryon excluída de tantos setores da economia japonesa, as
famílias não conseguem fazer a diferença através das matriculas, o que
significa os orçamentos operacionais e as matrículas diminuam.
Na Primeira Escola Coreana Secundária de Tóquio, onde a quarta e
quinta geração de estudantes coreanos são ensinados por professores da terceira
geração, o orçamento operacional é de 2 milhões de ienes por ano. Noventa por cento vem das mensalidades
e não há financiamento do governo. As escolas secundárias japonesas da região
recebem cinquenta por cento de seu financiamento do governo metropolitano de Tóquio. O governo
nacional dá as famílias um voucher de 112 milhões de ienes por ano, o que cobre
as mensalidades. As escolas coreanas são as únicas inelegíveis para o programa
de voucher.
Alimentado pelo governo direitista de Abe e seus ataques
institucionais contra a comunidade da Chongryon, reacionários racistas e
ultranacionalistas elegeram como alvo aqueles que são os mais vulneráveis:
jovens estudantes. Em apenas um exemplo, em 2009, 11 racistas foram para o
portão de uma escola de ensino primário da Chongryon e gritaram coisas como
“baratas coreanas!” contra os estudantes. Depois de se reunirem por uma hora,
eles continuaram destruindo o campo de futebol e o auditório da escola. O grupo
fez três aparições na escola. Em cada uma das vezes a polícia apareceu, mas só
ficou parada em silêncio.
Uma pesquisa na escola primária e secundária de Tóqui descobriu
que por volta de 20% dos estudantes foram assediados ou ameaçados por
direitistas entre 2003-2007.
Os direitistas atacaram os estudantes com facas. As estudantes
da Universidade da Coreia, por exemplo, não vestem mais os seus vestidos
tradicionais fora do campus, porque os direitistas rasgam os seus vestidos com
facas no metrô.
Ao longo de 2013, a polícia japonesa conduziu varias batidas
policiais na Chongryon. Em fevereiro de 2013, as autoridades japonesas fizeram
uma batida em Chongryon, com mais de 250 policiais e mais de 25 veículos
blindados. Recentemente, um grupo de estudantes da Universidade da Coreia,
retornando de uma viagem escolar na RPDC, tiveram todos os souvenirs
confiscados no Aeroporto de Haneda, Tóquio, quando retornavam. Anteriormente o
governo baniu a visita de oficiais da Chongryon à RPDC.
O governo Abe regularmente usa os estudantes coreanos como forma
de tentar ganhar vantagem em negociações com a RPDC. É uma tentativa de dividir
os coreanos no Japão da RPDC, que calorosamente regularmente acolhem os
estudantes da Universidade da Coreia e os membros da Chongryon, e mantém
estreitos laços com a comunidade coreana ali.
A Associação de Direitos Humanos dos Coreanos residentes no
Japão está envolvido em batalhas legais contra esse regime de apartheid. Eles
regularmente apelam à Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas.
The Human Rights
Association for Korean Residents in Japan is involved in legal battles against
this apartheid system. They regularly appeal to the United Nations Human
Rights Commission.
O futuro da Chongryon
Depois de eu visitar pela primeira vez uma escola de ensino
médio, em 2006, eu conheci o diretor e o vice-diretor da escola. Ele nos
perguntou nossas impressões. Eu fazia parte de uma delegação de coreanos
estrangeiros que estavam ali para comemorar o 60° aniversário de fundação da
Universidade da Coreia. Eu era o único cidadão norte-americano ali. Quando
chegou a minha vez, eu pensei em comparar minhas observações com o estado das
escolas nos Estados Unidos.
Eu comecei dizendo aos diretores que, nos Estados Unidos, muitos
comparam as escolas norte-americanas com prisões. Neste momento, meu amigo e
colega que servia como tradutor parou, olhando para mim com uma expressão
confusa. Um outro amigo interveio para traduzir. Depois, meu colega, que
cresceu em uma escola da Chongryon e ensina na Universidade da Coreia, pediu
desculpas e explicou o que tinha acontecido. “Eu não podia compreender o que
você disse, pois era uma noção muito estranha para mim, embora eu conhecesse
todas as palavras”.
Performance de música tradicional coreana em
uma escola da Chongryon Foto: Autor.
As escolas da Chongryon possuem um ambiente alegre, onde os
estudantes aprendem a serem orgulhosos de suas identidades e nação. Além de
aprenderem a língua japonesa, história, literatura, eles estudam a cultura,
história e política coreana. Eles comem comida coreana no refeitório. Eles
estudam cuidadosamente e atentamente a política coreana atual. Eles têm bandas
de rock que escrevem, produzem, e apresentam os seus próprios sons sobre a
reunificação da pátria.
As escolas da Chongryon aceitam todos os estudantes
coreanos. Não há exames de admissão e ninguém é recusado. A União de
Professores da Chongryon se encontram regularmente para estudar o que é
conhecido no ocidente como pedagogia diferenciada (como ensinar a cada aluno
individualmente).
Não é de surpreender que o meu colega tenha ficado tão confuso
ao ponto de não poder traduzir as minhas observações. As escolas da Chongryon
são o exato oposto das prisões. Elas servem como exemplo de beleza e
profundidade do anseio dos coreanos pela reunificação. Elas fornecem para os educadores
e ativistas da educação um modelo do que pode ser uma genuína educação
libertadora e descolonial. Imaginem se todos os povos oprimidos nos Estados
Unidos tivessem escolas onde eles tivessem o total controle sobre o currículo e
a pedagogia?
O movimento da Chongryon merece a solidariedade de todos os
cantos do mundo, mas particularmente de nós dos Estados Unidos. É o governo dos
Estados Unidos que é o principal obstáculo para a conquista da paz e da
reunificação da península coreana. A constante demonização e propaganda contra
a RPDC é um obstáculo fundamental para o movimento de paz pró-coreano nos
Estados Unidos. Contar a história do movimento da Chongryon é uma forma que nós
podemos trabalhar para combater a propaganda e nos colocarmos em solidariedade
com os coreanos no Japão e em toda a parte.
O autor gostaria de agradecer ao seu amigo na Chongryon e na
Universidade da Coreia por sua ajuda com a pesquisa para editar este artigo