Por José Reinaldo Carvalho (*)
A convite da Associação Coreana de Cientistas Sociais, uma delegação de ativistas pela paz e a solidariedade entre os povos e acadêmicos de Relações Internacionais, agrupados pelo Cebrapaz (Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Lula pela Paz), visitou de 3 a 17 de julho a República Popular Democrática da Coreia.
Éramos 11 brasileiros sequiosos de conhecer a experiência de construção do socialismo no enigmático país asiático e os atuais desdobramentos do conflito político e militar na Península Coreana, onde é saliente a questão nuclear.
Uma missão de estudos e amizade, em que mantivemos frutíferas conversações com os dirigentes da Associação, ouvimos palestras, entrevistamos cientistas sociais e percorremos instalações econômicas, sociais e culturais.
Nosso propósito foi o de conhecer algo mais sobre um país bloqueado e que não raras vezes é vítima da contrainformação e de campanhas caluniosas orquestradas pelos meios de comunicação sintonizados com os círculos imperialistas mundiais.
Conhecemos um povo altaneiro, dirigentes partidários, estatais e de organizações sociais firmes e convictos, gente temperada na luta e disposta a novos combates para construir o socialismo em meio a incontáveis adversidades.
Um povo culto, generoso, hospitaleiro, gentil, amistoso, disciplinado e belo.
Durante a viagem pelo interior do país, de geografia acidentada por montanhas escarpadas, fomos deslumbrados por uma encantadora paisagem primaveril, com verdes campos semeados de milho e arroz.
Duas semanas não são suficientes para conhecer a fundo o “país das manhãs serenas” – é este o significado do seu nome próprio derivado do idioma antigo. Mas nos deram uma visão panorâmica de uma nação e um povo empenhados na defesa de sua soberania e na construção de uma vida digna, baseada nos princípios do socialismo científico.
Visitar e percorrer a capital Pyongyang provoca um impacto especial, a sensação de estar em contato com um novo tipo de civilização urbana. A metrópole, hoje com cerca de três milhões de habitantes, foi totalmente reconstruída, com inaudito heroísmo, depois de ter ficado em ruínas pelos bombardeios da aviação norte-americana durante a Guerra da Coreia. A reconstrução da capital foi um capítulo à parte da história do socialismo coreano.
Pyongyang é uma cidade moderna, com amplas e extensas avenidas, organizadas como salas de estar e alamedas de um palácio real, com prédios coloridos e ruas alvas de tão limpas.
Uma cidade embelezada com magníficas obras, como o Arco do Triunfo, o monumento ao Partido do Trabalho, a Torre da Ideia Juche, o Arco da Reunificação da Pátria, o Palácio Kumsunsan, onde se encontram os mausoléus de Kim Il Sung e Kim Jong Il, o Museu da Revolução, o Museu da Guerra Patriótica, o Palácio Cultural e Artístico das Crianças, o majestoso Estádio Primeiro de Maio, o Palácio dos Estudos do Povo, monumental biblioteca totalmente informatizada, obras que expressam a peculiar cosmovisão coreana – grandiosa, com perspectiva de futuro e desafiadora em face das próprias dificuldades.
Uma República popular e socialista
A República Popular Democrática da Coreia (RPDC), fundada em 1945, é resultado de uma guerra de libertação nacional e uma revolução nacional, democrática, antifeudal e popular conduzidas pelos comunistas sob a liderança de Kim Il Sung, que foi uma das figuras mais destacadas do movimento comunista do século 20. O líder coreano fez parte da plêiade de dirigentes que marcaram a época das lutas e triunfos das revoluções populares, da construção do socialismo e dos esforços pela paz, tais como Stálin, Mao Tsetung, George Dimitrov, Enver Hoxha, Josip Broz Tito, Fidel Castro, entre outros.
Fundada a República popular, a Coreia lançou-se à construção do socialismo nas condições especiais de um país asiático atrasado e desde o início atropelado pela divisão do país e a agressão estadunidense.
A grande divisa dos coreanos, a marca distintiva da República popular e socialista coreana, é a independência das massas, a autonomia nacional e o apoio nas próprias forças.
O líder histórico da RPDC, Kim Il Sung, formou-se como dirigente comunista na escola do marxismo-leninismo e desde o início da luta, nos anos 1920, compreendeu a máxima de que a revolução e o socialismo não obedecem a ditames externos, mas são obra das massas populares autóctones. Criou então um pensamento próprio, a Ideia Juche, palavra-chave do modo de pensar, ser e agir dos coreanos, que não significa outra coisa senão independência e autossuficiência.
A RPDC percorreu um caminho de construção do socialismo com as próprias forças, nunca fez parte do Comecon, não obedeceu a nenhum centro e, muito embora ajudada pela antiga União Soviética e a China Popular, fincou pé na resolução de apoiar-se nas energias criadoras do próprio povo, construir a nova sociedade segundo as peculiaridades nacionais, cultivando a independência e o impulso revolucionário das massas populares.
Agir ao estilo coreano, esta é também uma divisa do método de ação do Partido do Trabalho, do governo, das organizações de massas e da intelectualidade da RPDC.
Nessas circunstâncias, o povo coreano, sob a direção do Partido do Trabalho, conquistou grandes êxitos na construção de uma sociedade socialista. Organizou a agricultura com base na propriedade coletiva – estatal e cooperativista, nacionalizou e estatizou os principais meios de produção, soergueu uma moderna e diversificada indústria pesada e ligeira, construiu um invejável sistema de defesa, incluindo o poderio nuclear, e foi capaz de assegurar os direitos sociais fundamentais.
A construção do socialismo na RPDC enfrenta as vicissitudes próprias da época atual. Um violento bloqueio econômico e financeiro, que sobreveio após a derrocada do socialismo na URSS e demais países do Leste Europeu, hoje agravado por novas sanções unilaterais dos EUA e do próprio Conselho de Segurança das Nações Unidas, criou dificuldades adicionais ao desenvolvimento do país.
Os anos 1990 foram especialmente difíceis, um período caracterizado como “a marcha árdua”, de escassez inclusive alimentar.
O apelo da paz e a questão nuclear
A delegação do Cebrapaz visitou a histórica localidade de Panmunjong, no Paralelo 38, onde foram assinados os acordos de armistício que suspenderam a Guerra da Coreia (1950-1953) e cristalizaram a divisão do país entre a Coreia do Norte (República Popular Democrática da Coreia, RPDC) e a do Sul (República da Coreia, ROK).
Divisão, aliás, não desejada pelos norte-coreanos, cujo antigo líder Kim Il Sung, falecido em 1994, propôs em diferentes ocasiões a reunificação da pátria, sendo esta ainda hoje uma bandeira de luta estratégica do povo coreano.
Foi em Panmunong que no ano passado os líderes máximos dos dois países que compartilham o território da Península Coreana – Kim Jong Un (RPDC) e Moon Jae In (ROK) – cruzaram a fronteira e abriram um novo capítulo nas relações intercoreanas, fazendo renascer as esperanças de finalmente estabelecer a paz na região, pondo fim à guerra iniciada em 1950 pelo imperialismo estadunidense.
Foi também em Panmunjong que, três dias antes da nossa chegada, Donald Trump tornou-se o primeiro presidente estadunidense a cruzar a fronteira norte-coreana, onde foi gentilmente recebido pelo sempre sorridente e diplomático Kim Jong Un, o jovem líder do país socialista.
Assim, quando chegamos a Pyongyang as expectativas que pairavam na Península Coreana eram de pavimentar o longo, sinuoso e escarpado caminho para a paz.
Contrariamente ao que se difunde no Ocidente, a RPDC aposta no fim do conflito e das tensões. Foi o que moveu Kim Jong Un a propor na mensagem por ocasião do Ano Novo em 2018 uma série de passos concretos, que simbolicamente começavam pelo esporte, para a retomada de um diálogo com a Coreia do Sul, há tempos congelado.
Da iniciativa resultaram as trocas de visitas entre Kim Jong Un e Moon Jae In e os três encontros entre o líder da RPDC e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Das reuniões de cúpula entre a RPDC e os EUA, a realizada em Singapura em 12 de junho de 2018 foi a mais produtiva e carregada de significados. Ali firmou-se uma Declaração conjunta que a RPDC reputa como um “documento histórico” e em relação ao qual sua liderança faz reiterados apelos para que os EUA cumpram a parte que lhes cabe dos compromissos assumidos.
A RPDC assumiu responsabilidades para solucionar a sempre tensa questão nuclear. Não houve, contudo, a contrapartida estadunidense quanto à suspensão das sanções com que o imperialismo pretende estrangular a economia do país e criar um ambiente instável, propício a forçar uma mudança de regime. Estas sanções configuram um bloqueio de grandes proporções, impedindo ao país o acesso ao comércio internacional e a meios financeiros.
Os EUA não só não deram um passo sequer no sentido de suspender as sanções e aliviar o bloqueio, como tampouco atenderam outra exigência norte-coreana: a suspensão dos exercícios militares que habitualmente realizam na Península Coreana em conjunto com a ROK, que a RPDC considera uma ameaça à sua integridade territorial e soberania nacional.
Esta foi a razão pela qual fracassou a segunda cúpula entre Kim Jong Un e Donald Trump, de fevereiro último em Hanói. O presidente americano deixou claro que o alívio das sanções só viria depois que a RPDC destruísse seu arsenal nuclear.
Por seu turno, o líder da RPDC conhece o animus dos presidentes estadunidenses para com o seu país. Trump é o 13° com os quais a RPDC tem lidado desde 1945. O povo coreano e sua liderança conhecem-nos bem. Em agosto de 2017, o atual chefe da Casa Branca ameaçou tratá-los com “fogo e fúria”. George W. Bush, senhor da guerra no início dos anos 2.000, catalogou a RPDC como integrante do “eixo do mal” e décadas antes, no alvorecer da construção do socialismo, a RPDC passou a figurar oficialmente na lista dos possíveis alvos de um ataque nuclear dos EUA. E nunca foi retirada desse índex.
Este foi um dos temas que centralizaram os nossos debates com os cientistas sociais, quadros partidários e de organizações sociais com os quais tivemos a oportunidade de conversar durante os 15 dias da nossa viagem pelo território da RPDC.
Explicaram-nos com toda a clareza e sem rodeios que a Coreia Popular tem razões defensivas e dissuasivas que justificam o seu programa nuclear: “Ante a ameaça nuclear estadunidense, nosso arsenal nuclear constitui um freio à intenção de Washington de varrer a República Popular Democrática da Coreia”.
As agências noticiosas ocidentais reagem com estardalhaço ante as provas nucleares e de mísseis balísticos da RPDC, mas nada dizem da corrida armamentista tecnológica que os EUA pretendem impor ao mundo, um de cujos exemplares mais notórios é o artefato B61-12 com o qual renova as bombas atômicas instaladas na Europa e em bases militares na Ásia.
É necessário um estudo à parte para verificar a quantidade e capacidade dos armamentos nucleares em território sul-coreano, assunto sobre o qual há no Ocidente desinformação e tergiversação.
Para além da questão nuclear com as quais os Estados Unidos ameaçam os povos em nome dos seus interesses na região asiática, essa potência imperialista realiza sistematicamente exercícios de simulação de guerra contra a RPDC. Em parceria com a Coreia do Sul, o exército e a marinha de guerra dos EUA realizam as manobras militares denominadas Freedom Bolt, Team Spirit, Key Resolve, Foal Eagle e Ulji Freedom Guardian. Agregue-se a isso que os Estados Unidos mantêm um contingente de 20 mil homens na Coreia do Sul.
Nesse quadro, a pergunta que não quer calar é se os EUA irão suspender tais ensaios guerreiros e desativar seu dispositivo nuclear na Ásia.
Os Estados Unidos ainda não deram plenas garantias ao governo da RPDC de que renunciarão aos seus planos de bombardear o país com armas nucleares.
Os especialistas com os quais a nossa delegação se avistou afirmaram que “é necessário estabelecer um acordo de paz entre a República Popular Democrática da Coreia e os Estados Unidos”, acreditando que isto “resolverá o conflito da Península Coreana”. Recordam que “a RPDC já propôs a concertação desse acordo, a fim de promover a paz, a estabilidade, aliviar tensões e eliminar preocupações sobre a segurança regional e mundial”.
Por óbvio, o país não renunciará sem garantias plenas à sua política de defesa nacional. O soerguimento de um arsenal nuclear e a posse de um sistema de mísseis balísticos é considerada uma “medida defensiva orientada a salvaguardar a soberania do país e o direito da nação a sobreviver e proteger a paz da Península Coreana e a segurança da região”.
Na mensagem por ocasião do Ano Novo em 2016, Kim Jong Un ponderava que os Estados Unidos deverão acostumar-se à posição da RPDC como país possuidor de armas nucleares, dotado de plenas capacidades de represália a ataques nucleares e a quaisquer outras ações que violem a integridade territorial e a soberania nacional do país.
Ao longo destes três anos, a RPDC tem reiterado a vigência das propostas para a cessação das manobras militares conjuntas EUA-Coreia do Sul, oferecendo como contrapartida a suspensão dos testes nucleares. Igualmente, a RPDC insiste em assinar um acordo de paz, pondo fim à anômala situação de guerra, desde a assinatura do armistício em 1953.
Há, assim, perguntas a fazer à diplomacia estadunidense, sul-coreana e das potências ocidentais, ou mesmo à ONU: por que os Estados Unidos e a Coreia do Sul até agora não aceitaram firmar um pacto de paz com a RPDC?! Até quando o cenário político e militar na Península Coreana será percebido no mundo com um olhar unilateral? Por que não são levadas em consideração as razões de defesa nacional que a RPDC invoca? São temas geopolíticos que requerem não apenas abordagem acadêmica mas respostas práticas, porquanto se referem também à paz mundial e à segurança internacional.
Essas respostas tampouco podem ser unilaterais e se revestir da forma de sanções. A tentativa de estrangular uma economia nacional como via para reverter regimes políticos é também uma forma de agressão e apresenta ao agredido o desafio de se defender com os meios que julgar adequados.
Os Estados Unidos, que deram início à escalada militarista e lideram a aplicação de sanções, assumiram formalmente em Singapura o compromisso de dar um passo atrás na execução dos seus planos agressivos. Mas até agora, as promessas de Trump ficaram no papel.
É interessante observar que a Declaração de Singapura de 12 de junho de 2018, um documento diplomático bilateralmente bem urdido, é ainda hoje, mesmo depois do fracasso da cúpula seguinte, de fevereiro de 2019 em Hanói, considerado pela RPDC como um documento histórico e com plena vigência. No entanto, já não se veem menções a ele nas posições do Departamento de Estado dos EUA nem nas considerações de especialistas em geopolítica e relações internacionais nas academias e nos meios de comunicação.
As razões invocadas pela República Popular Democrática da Coreia ligam-se ao princípio da autodefesa, direito de toda nação soberana, como pressuposto para construir um país forte, alcançar a reunificação da pátria e soerguer uma ordem econômica e social consoante a vontade de seu povo e suas peculiaridades nacionais.
A RPDC tem noção do mundo em que está inserida, da correlação de forças real, e não desconhece que é necessário envidar todos os esforços pela solução pacífica dos conflitos internacionais e por uma solução negociada ao problema nuclear na Península Coreana.
Tudo pelo desenvolvimento econômico
Durante a visita, constatamos que, sem abrir mão da defesa nacional, a República Popular Democrática da Coreia hoje concentra todas as suas energias na construção de sua força econômica, consciente de que a exacerbação de crises diplomáticas, militares ou mesmo a nuclear na Península não é favorável a esse objetivo.
A rigor, analisados friamente os fatos, a Coreia Popular não tem qualquer interesse de provocar quem quer que seja. Os Estados Unidos, o Japão e a Coreia do Sul, estes sim, deveriam desanuviar seu comportamento, prisioneiro de uma psicose de guerra e de posições preconcebidas sobre a RPDC.
Na mensagem de Ano Novo de 2016, Kim Jong Un explicitou que a tarefa prioritária do país passava a ser “o desenvolvimento econômico e a melhoria da vida do povo, razão pela qual a RPDC necessita mais do que nunca de uma situação estável e de um ambiente pacífico”.
O documento representou uma viragem política, um realinhamento da orientação norte-coreana: primazia ao desenvolvimento econômico.
Foi esse o debate central em que encontramos o país imerso durante os 15 dias da visita. Um debate de dimensões estratégicas, de caráter político e ideológico sobre a etapa atual da construção socialista.
A discussão tem por referência o discurso pronunciado por Kim Jong Un na primeira sessão da 14ª legislatura da Assembleia Popular Suprema, em 12 de abril deste ano.
“A tarefa principal que se apresenta ante nossa República na etapa atual da construção da potência socialista é consolidar o fundamento material do socialismo, concentrando todas as forças do país na edificação econômica” – esta é a diretriz fundamental do governo.
Sem abrir mão dos conceitos desenvolvidos anteriormente sobre a defesa nacional, a ênfase atual é a construção de uma “economia independente e poderosa”. A palavra de ordem é enfrentar e invalidar as sanções econômicas e financeiras.
Começa assim uma grande batalha para adequar a construção da economia socialista às condições do país, modernizá-la, informatizá-la e introduzir nela as últimas conquistas científicas da humanidade.
Nesta etapa, torna-se imprescindível o abastecimento de energia, combustíveis e matérias primas, e reativar a indústria metalúrgica e química.
No quadro do bloqueio e das tentativas do imperialismo de estrangular a economia do país e as condições de vida do povo, entra na ordem do dia a prioridade da segurança alimentar: “É necessário resolver o mais rápido possível o problema dos alimentos e dos artigos de consumo, de grande importância para melhorar a vida da população”, diz Kim Jong Un. E detalha: “No setor da agricultura é necessário prestar especial atenção ao abastecimento de sementes, água e terras cultiváveis, introduzir métodos de cultivo científicos, elevar o grau de mecanização do trabalho agrícola e atingir as metas estabelecidas para a produção de grãos”.
A RPDC deseja auferir os benefícios da revolução tecnológica e científica em curso no mundo. “Devemos modernizar a informatizar ativamente a economia nacional para convertê-la com segurança na economia do conhecimento”. “É preciso elaborar estratégias e metas para o desenvolvimento das indústrias mais avançadas como a mecânica, a eletrônica, a informática, a de nanotecnologia e bioengenharia”. (…) Em todos os setores construir fábricas e modelos que integrem as ciências, a técnica e a produção e tenham um alto nível de automatização, inteligência e capacidade de produzir sem a intervenção humana, com a finalidade de elevar o nível da economia em seu conjunto ao dos países avançados”.
Para isso a estratégia da Coreia Popular é desenvolver a economia local e ativar as relações econômicas com o exterior.
Consciente de que “os talentos, as ciências e a tecnologia constituem a principal força motriz para o desenvolvimento da economia independente”, o governo da RPDC lançou a palavra de ordem de “intelectualização de todo o povo”, o que implica um conjunto de medidas para elevar o nível educacional. Hoje a Coreia Popular assegura educação pública e gratuita a toda a população em todos os graus. E tornou obrigatório o ensino desde a escola primária até o pré-universitário.
Atualização da política externa
Como já tinha feito nas mensagens de ano novo de 2016 e 2018, também no pronunciamento perante a Assembleia Popular Suprema, em 12 de abril último, Kim Jong Un dedicou a máxima atenção à política externa.
Reafirmou a “luta histórica” da RPDC pela reunificação do país, por ele considerada como “anseio supremo da nação”. E valorizou as demarches diplomáticas dos últimos anos: “As três cúpulas históricas Norte-Sul do ano passado e as declarações nelas aprovadas propiciaram mudanças transcendentais nas relações intercoreanas”. (…) “Toda a nação deseja com veemência que se implementem cabalmente a Declaração de Panmunjong e a Declaração Conjunta de Pyongyang de setembro (2018), documentos de relevância histórica, de modo que continue reinando a atmosfera de paz na Península Coreana e as relações Norte-Sul continuem melhorando”.
O pronunciamento dedica amplo espaço às relações com os Estados Unidos. São palavras que deveriam ser seriamente tomadas em consideração pelas chancelarias mundiais, principalmente das grandes potências e pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Também as forças progressistas e amantes da paz em todo o mundo deveriam dedicar mais atenção ao estudo da diplomacia norte-coreana, isentando-se de qualquer preconceito.
“A cúpula RPDC-EUA – diz Kim Jong Un -, a primeira em toda a história realizada em Singapura em junho do ano passado, atraindo a atenção do mundo, foi um evento transcendental que deu a esperança de uma paz duradoura na Península Coreana. Por sua parte, a Declaração Conjunta RPDC-EUA de 12 de junho, que anunciou ante o mundo que os dois inimigos de séculos escreveriam uma história de novas relações, recebeu o total apoio e aprovação da comunidade internacional amante da paz”.
A RPDC está imbuída do sentimento de que deu os primeiros passos. Tomou importantes iniciativas no sentido da distensão, como a interrupção dos testes nucleares e de lançamento de mísseis balísticos intercontinentais. São passos que levam à criação de um ambiente de confiança que pode pavimentar o caminho para a paz.
Mas é óbvio que a RPDC não pode – nem deve – renunciar aos seus propósitos de independência e segurança, nem se deixar chantagear pelo mecanismo das sanções, como parece ser o jogo político e diplomático de Trump. Para além de ser um ato de soberania, é uma atitude que contribui com seu exemplo de firmeza e altaneria, com os próprios esforços das nações que lutam para preservar sua independência e defendem sinceramente a paz mundial.
Kim Jong Un sintetiza a política externa do seu país: “O governo da RPDC consolidará e desenvolverá os laços de amizade e cooperação com todos os países do mundo que respeitam a soberania de nosso país e o tratam amistosamente e avançará passo a passo com todas as forças amantes da paz no mundo para estabelecer um duradouro e sólido sistema de paz na Península Coreana”.
Como assinalamos, o centro da orientação atual é o desenvolvimento econômico e o enfrentamento das dificuldades impostas pelas sanções internacionais.
A Coreia Popular não quer o isolamento, mas não abre mão de sua independência. Com ou sem sanções, dizem os norte-coreanos, valerá sempre a consigna: apoiar-se nas próprias forças.
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Este artigo foi originalmente publicado na revista Esquerda Petista
(*) Jornalista, editor da Página da Resistência [www.resistencia.cc], diretor do Cebrapaz e membro da direção nacional do Partido Comunista do Brasil (PCdoB)